quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

O drama e a geopolítica no Haiti

Dia 12 de janeiro...comemorando singelamente meu aniversário no litoral nordeste brasileiro, sem saber o que leria num jornal em Recife, no dia seguinte. Notícias sobre um pequeno tremor na região, assustando algumas pessoas. Qual surpresa foi a de saber de que posteriormente,no Haiti, o tremor foi catastrófico. Atingindo 7 pontos na escala Richter, a confluência de duas placas tectônicas (Placa Norte-Americana e Placa Caribenha), entremeadas pela Microplaca Gronave, gerou um deslocamento de 1,5 metros (normalmente, o deslocamento anual é de poucos milímetros).

Fonte: Adaptado da Revista VEJA, ed. 2148 - 20 de janeiro de 2010.




Mais um desastre para a ilha de Hispaniola, que abriga o Haiti e a República Dominicana.

Os haitianos não contavam com mais essa. Tendo que conviver com o pior IDH da América e ainda por cima ver agora suas construções serem destruídas. Mais de uma centena de milhares de mortos e a impotência em relação às "forças da natureza". Entre as vítimas, vários brasileiros, inclusive a a médica catarinense Zilda Arns. Fundadora da Pastoral da Criança, fundamental na redução da mortalidade infantil no Brasil, sendo que sua área de influência abrange mais de 70% do território brasileiro, além de outros países da América Latina, África e Ásia.

Mas á compreensão da tragédia é incompleta se desconsiderarmos outra força importante da natureza, a força social...sim. Essa falsa idéia de que sociedade e natureza são elementos distintos partiu do positivismo do século XIX. Idéia que, embora antiquada, é frequentemente encontrada nos discursos atuais e que dão informações fragmentadas sobre o entendimento do espaço. Basta procuramos entender um pouco o milagre da vida, o milagre da concepção, para percebermos como o ser humano é natural, assim como nosso mundo é formado por elementos naturais. Dissociar os propósitos e atividades humanas, natureza vegetal e mineral é separar elementos com origens comuns.

Então outra força natural já influencia na tragédia haitiana. A sua formação sócio-espacial. Um país no qual sua história foi marcada por uma rebelião "bem sucedida" de escravos africanos contra os colonizadores franceses, que culminou com sua independência em 1804. Bem sucedida? Tal qual como em vários países africanos, o período pós-independência ressaltou a inexperiência de um povo explorado por muito tempo, incapaz de assumir a organização do país, ficando suscetível a intervenções estrangeiras e a ditaduras, mergulhando o país num caos econômico-social, o que provocou uma elevada onda de emigrações, principalmente para os EUA, que já estão "por aqui" com os imigrantes.

Um país com todos estes problemas, atingido por um terremoto de 7 graus Richter. A tragédia com certeza seria bem menor se fosse no Japão por exemplo, mesmo com um terremoto de mesma magnitude. Então conclui-se que a tragédia também se intensificou com a força natural de sua organização sócio-espacial.

E a tragédia serviu também para chamar a atenção sobre outra questão importante para o Haiti: as influências internacionais. Vendo o Fantástico, no último domingo, me chamou atenção uma enfermeira grávida que foi resgatada após muito tempo soterrada. Quando conseguiram resgatá-la ouviram-se gritos de: Brasil!!! Brasil!!! Por que não gritaram: viva!!! ou graças a Deus!!! Esse pequeno momento da reportagem me chamou a atenção para uma questão geopolítica importante. Qual o motivo de associar esse resgate ao nome do nosso país? Que nacionalismo...o que tem a ver o nosso país com o momento de resgate da vítima?

Exalta-se então a geopolítica no Haiti. O Brasil chefia a missão MINUSTAH, que foi criada pela ONU em 2004 para restabelecer a ordem no Haiti. Mais de 1200 soldados brasileiros foram enviados a região. Por que logo brasileiros? Porque o Brasil almeja se tornar uma liderança mundial e entrar como membro permanente do Conselho de Segurança da ONU, que tem atualmente apenas 5 membros permanentes: França, Reino Unido, EUA, Rússia e China, além de 10 membros rotativos. Decidem sobre missões de paz e intervenções militares. Tem poder de decisão na ONU em questões geopolíticas internacionais, inclusive de conflitos, além do que os membros permanentes tem o poder de veto.
Para uma posição de liderança durante o controle social no Haiti, o Brasil obteve certo destaque. Embora não contribuiu para melhorar a situação sócio-econômica do país, pelo menos manteve influência para que as coisas não piorassem. Mas a liderança da missão ficou ofuscada após a tragédia do tremor. Nas missões de ajuda ao Haiti, os EUA tiveram mais uma chance de mostrar sua supremacia, deixando mais uma vez a liderança brasileira em segundo plano.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Reflexões geográficas sobre o pós-crise


2010... Diferentemente do início de 2009, quando se alardeava uma organização mundial entrando em crise, o início do atual ano é dito como o período pós-crise, o período em que as expectativas de crescimento são maravilhosas, que há previsão para geração de empregos e melhoria da qualidade de vida em geral.


Pós-crise? Que crise é esta, alardeada pelos economistas com base em estatísticas desconexas? Estamos mesmo no pós-crise?

O Oriente Médio ainda vive clima de tensão com as disputas territoriais e pelas reservas petrolíferas, que fazem da região uma das mais ricas do mundo, sendo a renda per capita um indicador que faz brilhar os gráficos estatísticos. Mas e a maioria da população que nem sequer sente o cheiro dos altos investimentos, e rezam incessantemente para terem acesso mais fácil à água e pelo menos amenizar os sintomas da pobreza? Será que essa maioria sentiu bem a crise e sentirá agora o pós-crise?

E o que dizer dos países africanos, onde as taxas de natalidades são as maiores do mundo e convivem justamente com os piores IDH's? Imagino que a crise na qual se encontram estão relacionadas a fatores bem mais marcantes e que existem já há bem mais tempo, e não vêem tão cedo o pós-crise.

E o Brasil? Considerado um dos países que passaram melhor pela crise. Você sentiu os efeitos negativos da crise e está com esperança nos efeitos positivos do pós-crise? Se a resposta foi positiva, saiba que você faz parte da minoria. Ainda analisando um pouco mais sua resposta, vai perceber que o momento de crise que imagina não foi o pior que você pensou, assim como o período atual não tende a ser muito diferente, a menos que você tome as ações necessárias para modificar o que deseja. Mas se isso acontecer, sua vida iria melhorar tanto na crise quanto no pós-crise.


Crise sim, da minoria, que por muitas vezes detém os meios de comunicação e o alarde serve mais como meio para desculpas esfarrapadas tentando explicar atitudes economicamente desumanas. Agora não mais, pois estamos no pós-crise, vão ter que arranjar outra desculpa.

Verdade sim, várias empresas fecharam no início do ano passado, vários desempregados, mas isso já não vinha acontecendo há tempo na Nova Ordem Mundial? E a grande massa de desempregados que ainda existe no mundo? Seriam beneficiados pelo pós-crise? Acho de melhor análise imaginarmos uma crise constante, e mesmo assim com melhorias a cada ano, pois as crises constantes são motivadoras para a evolução mundial.

Para se falar em crise as estatísticas por si só nos dão respostas incompletas, entender o espaço mundial passa por análises muito mais de conexões de elementos, com respeito a sua história, do que simplesmente de dados. E esta é uma grande função da geografia, embora muitos ainda pensem que é uma ciência apenas de mapas, e de decorar países e capitais. Numa reportagem de uma renomada revista nacional, em setembro de 2009, havia três grandes explicações que procuravam mostrar porque os EUA superaram seus vizinhos: uma cultural, outra institucional e outra geográfica. Claro, a geográfica extremamente determinista, buscando a razão nos fatores físicos. E quem vai explicar para eles que a geografia é também cultural, institucional e histórica?
Talvez a crise seja melhor explicada por alguém que entenda a dinâmica do espaço geográfico. Tira-se uma importante conclusão: como há carência de geógrafos na mídia.


E você vestibulando? Para um educador é difícil falar isso, mas ainda a maioria dos vestibulares ainda vai lhe cobrar questões relacionadas a geografia decorada, e ao mundo pré e pós-crise. Você vai precisar saber o que eles querem, afinal, sua intenção com o vestibular é entrar na universidade e não apontar sua visão do mundo. Mas a visão de mundo é pra vida inteira, algo de muito mais valor que apenas saber a resposta correta de uma questão de alternativas.